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Foto do escritorKael Avila

Guia básico do movimento pansexual

Atualizado: 20 de mai. de 2021

Texto originalmente publicado em Everyday Feminism, escrito por Kaylee Jakubowski em novembro de 2014 e traduzido por Kael Avila. 

Para alguns, a sigla LGBPTTQQIIAA+ (mais conhecida em alguns lugares como “a sopa de letrinhas queer — ou transviada) pode ser intimidadora em seu próprio senso de inclusão à tudo — “como raios eu poderia não apenas memorizar toda identidade nessa tempestade, mas também aprender a respeitar elas em meu cotidiano?”


Bom, não se preocupe, cara feminista!

Assim como apertar as mãos e bater um papo tomando uma xícara de chá com alguém pode dar uma compreensão profunda e pessoal sobre essa pessoa, conhecer o básico dessas identidades também ajudará a aliviar esse sentimento de sobrecarga.

Então vamos explorar uma identidade específica dessa sigla — a pansexualidade.

 

Visão Geral e História


Primeiro, vamos desconstruir essa palavra em partes.


“Pan-” é um prefixo grego que se refere à “todos” ou “tudo” se unindo como um só. Podemos citar alguns exemplos desse prefixo em outras palavras, como em “Pangeia” (o antigo continente da Terra que era basicamente todos os outros 7 continentes em um só território), ou “panaceia” (um remédio para todos ou males e dificuldades). Ou até a palavra “Pan-óptico” (uma estrutura de prisão em que um guarda pode ver todos os prisioneiros que, por sua vez, podem ver todos os outros prisioneiros — o filósofo Michel Foucault usa essa metáfora para falar de policiamento de uns aos outros na sociedade). Quando se une esse prefixo com “-sexual”, que é reconhecido como indicador de desejos e hábitos sexuais, cria-se a palavra “pansexual”, que nesse caso significaria “alguém que se sente atraído por pessoas de todos os gêneros”. Construção similar à palavra “panromântico”, que iria se referir à uma pessoa assexual que sente uma atração romântica por pessoas de todos os sexos e gêneros. A palavra “pansexual” foi originalmente cunhada por Sigmund Freud em suas teorias psicanalistas na primeira metade do século XX, mas naquele caso falava sobre como a energia e o desejo sexual era a base da interação humana. De qualquer maneira, o uso moderno de “pansexual” tem quase nada relacionado à definição de Freud ou suas teorias psico-sexuais. O uso moderno (que é inclusive sobre ele que me refiro nesse artigo) começou a ganhar espaço na primeira metade da década de 90. É difícil demarcar quando exatamente começou-se a usar o termo, mas com certeza está ligado ao crescimento do ativismo e conscientização de pessoas não-binárias e genderqueer, uma vez que sem essas identidades não existiria a pansexualidade. Isto, de alguma forma, é confirmado olhando para os dados de pesquisa do Google, que nos mostra que a presença de pesquisas da palavra “pansexualidade” começou em setembro de 2007, um ano após a presença das pesquisas por “genderqueer” começar. Desde essa época a identidade ganhou mais atenção e reconhecimento dentro da comunidade LGBTI+, chegando até em eleições estaduais de pessoas pansexuais (como aconteceu no Texas).

 

O Básico da Pansexualidade

Como qualquer outra identidade no meio LGBTI+, as pessoas podem (e vão — e devem) definir uma identidade na qual mais adapta e faz sentido em sua própria vivência. Enquanto a definição de pansexualidade, como vimos, seria precisa e exata, algumas pessoas pansexuais tem maneiras ligeiramente diferentes de definir sua sexualidade. Por exemplo, a galera do Pansexuality is Perfect define pansexuais como “pessoas não limitadas ou inibidas na escolha sexual em relação a gênero” [algo como “atração independente do gênero”]. Outras pessoas também descrevem sua pansexualidade dizendo que “apenas não focam em gênero ou sexualidade, e sim na pessoa.” Enquanto todas essas maneiras de expressar a pansexualidade são um pouco diferentes, todas elas são legítimas e ajudam a definir a pansexualidade em sua diversidade e inclusão (que é o que essa identidade representa). Olhando de maneira mais prática, o que podemos saber de alguma pessoa quando ela se apresenta como pansexual? Bom, uma das melhores partes quando se fala sobre pansexualidade é sobre sua falta de dependência quanto a gênero. Isso significa que, diferente de alguém que se identifica como gay, nós não precisamos saber o gênero dessa pessoa para saber que tipo de gente ela seria atraída. Isto é, alguém que se identifica como pansexual, independente do seu sexo ou gênero, pode se sentir atraída por homens cis, homens intersexos, homens trans, pessoas agenero, pessoas genderqueer ou de qualquer outro gênero não-binário, mulheres trans, mulheres intersexo, mulheres cis, ou qualquer outra combinação de sexo, gênero ou expressão de gênero. Para algumas pessoas pansexuais, essas distinções de gênero podem, de alguma forma, afetar sua atração. Para outras, são apenas informações irrelevantes para a sua sexualidade. Cada pessoa pan pode descrever sua sexualidade de maneira única, mas uma coisa sempre se mantém: a possibilidade de se sentir atraído por qualquer pessoa de qualquer gênero ou sexo.

 

A Política da Pansexualidade

A pansexualidade está intrinsecamente ligada às políticas do ativismo e conscientização do movimento não-binário e genderqueer, uma vez que essa sexualidade não existiria sem esses ativismos. Essa história, e as implicações políticas que a seguem, é uma das mais importantes partes da pansexualidade, é o que primeiramente a define. Aliás, igual ocorre com a bissexualidade (assim definida por múltiplas organizações) que é inclusiva a todos os gêneros, a pansexualidade também nega qualquer binarismo em seu nome. De fato, a crianção da palavra pansexualidade foi pensada justamente para priorizar o reconhecimento, em sua própria sexualidade, da atração por pessoas de gêneros não-binários, ageneros e genderqueer, e em conjunto todas as suas políticas que seguem essas identidades. Na verdade, líderes e ativistas tanto da bissexualidade, quanto da pansexualidade, trabalham juntos para a inclusão de pessoas não-binárias, porém é a bissexualidade que é injustamente acusada de binarismo e outros essencialismos baseados em gêneros. Esse discurso, da bissexualidade ser binária, tem raízes bifóbicas e ajudam no apagamento e invalidação da sexualidade, da identidade e do ativismo bi. O mesmo discurso leva ao pensamento de que a pansexualidade é a única opção sexual anti-binarista — o que não é verdade. Embora a comunidade pan tenha feito um trabalho incrível construindo um ativismo social e intelectual sobre a pansexualidade, anti-bissexuais contribuem com a crença que a pansexualidade é a única identidade confortável àqueles que são particularmente entusiasmados com o ativismo baseado na diversidade dos gêneros não-binários. Isso também é injusto e é mentira. A criação da identidade pansexual, no entanto, permitiu uma análise e discussão mais intencionada quanto às relações entre a sexualidade humana e o gênero. Além de ser um rótulo real e válido para pessoas se identificarem, a pansexualidade também começou a influenciar ativamente as ondas de ativismo e teorias sexuais modernas.

 

Mitos Comuns da Pansexualidade

Agora que sabemos o que a pansexualidade é, vamos conversar sobre o que ela não é, e desconstruir alguns mitos comuns que as pessoas tem sobre essa identidade. Mito 1: Pansexualidade e bissexualidade é a mesma coisa. …Falso? Isso é uma discussão complicada, mas o consenso é que a pansexualidade e a bissexualidade são identidades diferentes, mas relacionadas. A maior causa disso é porque as pessoas pansexuais se definem sendo atraídas por todo e qualquer gênero ou sexo — geralmente afirmando que existe a atração pela pessoa em si, e não pelo gênero dela. Já a bissexualidade é usualmente definida como a atração pelo gênero/sexo que a pessoa se identifica e pelos outros tantos gêneros/sexos nos quais ela não se identifica, nesse caso pode ter limitações na sexualidade quanto aos gêneros e sexos, mas pode ser que não tenha. Há realmente várias similaridades entre essas duas identidades, elas não são completamente diferentes, mas também não são a mesma. Mito 2: Se pansexuais são atraídos por todos os sexos e gêneros, eles vão pra cama com todo mundo. Falso! Só por que uma pessoa pansexual pode se sentir atraída por pessoas de todos os gêneros, não quer dizer que ela vai se atrair por todas as pessoas desses gêneros e sexos. E isso não quer dizer que não há pessoas pan que gostem muito de fazer sexo — ou que não há pessoas pan que não gostem de fazer sexo nenhum. Comportamento sexual e identidade sexual são independentes, se dizer pansexual não diz nada quanto ao seu comportamento sobre sexo. Da mesma forma que pansexuais podem (ou não) ser poliamorosos. De novo, comportamento sexual é independente da pansexualidade. Mito 3: Pansexualidade é coisa de Tumblr, não existe de verdade. Eca, FALSO! Sim, pansexualidade talvez tenha uma cultura predominantemente presente entre os usuários do Tumblr e, sim, a maioria das melhores informações sobre pansexualidade podem ser encontradas dentro desse site, mas só porque você não gosta da mídia que popularizou essa identidade, isso não significa que ela é ilegítima. Identidades não existem num vácuo — estadunidenses no Tumblr não pararam de se relacionar com a cultura ocidental apenas porque usam Tumblr. Qualquer posição que as pessoas do Tumblr criam é tão legítima quanto as posições de alguém que nunca usou a Internet na vida. Mas, para despistar esse argumento bobo, é só olhar para os dados de pesquisa do Google, que nos mostra que o termo “pansexual” teve uma atividade significativa em mais de três anos antes da “pansexualidade do Tumblr” ter qualquer sinal de existência. Então por favor — pare de culpar o Tumblr pelos seus próprios comportamentos contra a comunidade queer (ou transviada). Agora que destrinchamos alguns mitos e definições da pansexualidade, cara leitora feminista, espero que tenha tido um entendimento mais complexo e profundo sobre o que significa para alguém ser pansexual, e todas as questões que envolvem essa identidade. Entender a diversidade das sexualidades tomou grande importância para o ativismo e teoria feminista, e se manter ativa com a comunidade transviada é se manter contra a cultura homogênica. Isso continua tão importante agora como foi no passado — independente qual seja o seu gênero ou sexualidade.

 

Sobre a autora: Kaylee Jakubowski é uma escritora do site Everyday Feminism. Ela é trans, queer-feminista e tem foco em ecofeminismo, anti-imperialismo, assuntos queer e métodos estatísticos para o trabalho de justiça social. Ela está em um bacharel em estatística com especialização em estudos de gênero.


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